terça-feira, 10 de setembro de 2013

Os puros e os espúrios (III) - o PCP

Já disse o suficiente sobre o PCP, aqui e aqui, para agora passar para a continuação da série de textos sobre as propostas de cada partido para a resolução da crise, mormente a sua posição em relação ao memorando de submissão à troika e em relação ao euro. É bem sabido que o PCP se opôs, desde início, à nossa adesão à então CEE e, depois, à entrada no euro.

Tenho dúvidas em relação à primeira questão. Não sei o que resultaria do nosso isolacionismo num momento de pujante desenvolvimento de um espaço económico europeu, quando ainda tínhamos muitos emigrantes nos países centrais europeus e era para eles que exportávamos principalmente. Quanto ao euro, confesso que, como muita gente – mesmo os então meus amigos do MDP – não vi que a eurolândia estava condenada ao fracasso, não cumprindo as condições mínimas de “zona monetária óptima”. Mas também a posição do PCP era mais política, baseada em posições relativamente lineares de anti-imperialismo, do que em análise económica.

Hoje, parece-me que a posição fortemente crítica do PCP em relação à crise e à política austeritária que domina a perspectiva neo, ultra ou ordoliberal da União Europeia e de todos os círculos hegemónicos, política e economicamente, é firme e clara. Pode-se dizer que também o é a do BE (de que falarei noutra entrada) e até a do PS, quando defende menos austeridade, embora seja diferente defender austeridade mínima para redução do défice e da dívida à keynesiana, em situação de pleno emprego, como faz o PCP, e defender uma simples suavização da austeridade à troika – como, na lógica da sua política? – como faz o PS.

Da mesma forma, julgo haver uma diferença notória entre o PCP, por um lado, e o PS e o BE, por outro, em relação à reestruturação da dívida (talvez não seja sem significado que estes falam de renegociação). Como é óbvio, todos falam de negociação para alívio das condições dos empréstimos, em termos de maturidade e taxas de juro. Mas só no caso do PCP é que vejo claramente a proposta de reestruturação da dívida em termos do seu montante, incluindo a adopção de “haircuts”.

Mais manifesta é a posição em relação à permanência ou não na zona euro. A saída do euro é tabu para o PS e mesmo para o BE, nisto continuando muito influenciado por Louçã, apesar de tanto ter sido criticado por erros técnicos clamorosos (dizem economistas seus colegas) quanto aos custos da saída, nomeadamente por via de uma consequente inflação, que Louçã exagera. Note-se que Louçã é suspeito em tal matéria. No número de Maio de 2013 do Monde Diplomatique (edição portuguesa) pode-se ler uma boa colecção de artigos sobre o euro, todos bem fundamentados economicamente. A excepção é o artigo de Louçã, de natureza vincadamente ideológica. No fundo, ainda é a afinidade com a “fada europeia” em que acreditam todos os trotsquistas europeus. Trotsquista em jovem, trotsquista até morrer? Valha a coerência, porque maoísta em jovem, conservador em velho.

O PCP não defende em definitivo a saída do euro, mas não a afasta. No seu XIX Congresso, em 2012, afirmou por intermédio de um quadro importante, Agostinho Lopes, que “um governo patriótico e de esquerda deve preparar o país para a saída da zona euro”, e advertindo que "é uma ilusão pensar que o federalismo é solução” mas também, por outro lado, que também é ilusão “a ideia de que tudo se resolve com uma saída pura e simples do euro, qualquer que seja a forma como se sai e as condições de saída”. 

Mais tarde, a segunda afirmação foi menorizada e a posição ficou mais clara com sucessivas declarações, inclusive de Jerónimo de Sousa, defendendo estudos rápidos sobre as consequências de uma saída do euro, não considerada como tabu.

Entretanto, na evolução das sondagens, a queda do PSD não é acompanhada de subida significativa do PS nem do BE, mas sim do PCP. Então, com uma posição clara sobre a crise e os malefícios do euro para Portugal, com uma atitude combativa contra a política antipatriótica do governo e com presença significativa na rua, com outras forças, com crescimento da sua posição nas sondagens, porque é que a opinião geral é de que o PCP não conseguirá (até dizem que nunca) ir para o governo?

É aqui que me parece que isto se entronca com os meus “posts” anteriores sobre o PCP, porque a política não é só o agora. Há muito passado, há muitos erros, também muitos preconceitos, que ainda são entraves a um seu papel determinante na alternativa de governo.

Por isto, continuarei esta entrada noutro registo, em que já escrevi, o da minha experiência no PCP. Até breve.

P. S. (10.9.2013) – Muita gente, talvez a maioria da gente, de vários quadrantes, reconhece hoje os “malefícios do euro” e os prejuízos causados à economia portuguesa e bem estar económico do povo e pequenas empresas por uma adesão com excessiva valorização, anti-competitiva, do euro em relação ao escudo e, depois, pela perda de instrumentos essenciais de soberania económica, ligados à moeda própria.

Porque é que também não reconhecem razão, a posteriori (já não é mau) a todos os que exigiram um referendo ao tratado de Maastricht? Porque não se escandalizam, mesmo a posteriori (já não é mau) com aquela obscena e popularucha conversa, exemplar de bloco central, na aprovação do tratado de Lisboa, entre Barroso e Sócrates, “porreiro, pá”?

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