Quando Paul Krugman veio a Portugal receber o seu honoris causa, afirmou que há uma diferença de 20% entre os custos unitários de trabalho entre Portugal e a Alemanha, problema que é necessário resolver para que a nossa economia ganhe competitividade. A tese, para alguns economistas que tenho lido, não é tão linear, mas eu leigo vou admitir nesta nota o argumento de autoridade, que Krugman tem razão.
Como provavelmente recordam, isto foi interpretado como um apoio de Krugman à desvalorização interna. A direita política e económica e os seus acólitos da comunicação embandeiraram em arco: “veem, não dizíamos? O que é preciso é reduzir os custos de trabalho (salários, segurança social, etc.) para o nível alemão”.
Claro que não é bem assim. Uma relação é sempre bidirecional. O exemplo a seguir parece parvo ou simplório, mas olhem que não. Eu posso ter uma mesa com 70 cm de altura e o meu colega de escritório, ao lado, ter uma de 80 cm. Elas fazem diferença de 10 cm, 13,3% em relação à média. Mas é a minha mesa que é mais baixa ou a do meu colega que é mais alta? E para que fiquem da mesma altura, tanto posso acrescentar 10 cm aos pés da minha mesa como o meu colega cortar 10 cm à dele. Ou até eu aumentar 5 cm e ele cortar outro tanto.
É isto que agora Krugman vem lembrar, num “post” recente (tradução minha).
“Quando se diz que ‘os salários nominais portugueses são demasiado altos’ tem de se explicar ‘relativos a quê?’. A resposta, claro, é ‘relativos aos salários alemães’. (…) Mas Portugal não compete assim tanto com a Alemanha. Hum! Suponha que eu podia agitar uma varinha mágica (ou tocar umas notas numa flauta mágica) e fazer aumentar subitamente em 20% os salários alemães. O que pensa que aconteceria ao valor do euro contra o dólar e outras moedas? Cairia bastante, não é? E as exportações portuguesas ficariam muito mais competitivas em toda a parte, incluindo os destinos não-alemães ou, mais geralmente, não-europeus.
(…) A diferença crucial entre as relações económicas entre a Alemanha e Portugal e, por exemplo, entre os EUA e El Salvador é que a Alemanha e Portugal partilham a mesma moeda. Isto cria obrigações à Alemanha, goste ela ou não. “
NOTA – Talvez haja quem pense que tudo o que há de “mau alemão” nesta crise tem marca da Senhora Merkel. Quanto à desvalorização interna que ocorreu na Alemanha na primeira década deste século, não é verdade. Para vergonha da social-democracia alemã (mas o Sr. Blair e tudo o que foi terceira via na Europa também fizeram o mesmo) a degradação da situação salarial e social dos trabalhadores deve-se à Agenda 2010 do governo Schroeder, de coligação entre o SPD e Os Verdes. Primeiro foram as leis imaginadas pelo guru de Schroeder, Peter Harz, principalmente a famigerada lei Harz IV, depois todos os acordos sociais em que os sindicatos se puseram a jeito, resultando tudo num grande “dumping” salarial.
Quando um país industrialmente avançado faz dumping salarial, esmaga economicamente os que pagam os bens na mesma moeda mas têem uma produtividade muito inferior. O lado financeiro do fenómeno vem a seguir, porque as receitas e despesas do Estado são expressão dessa economia em que cada unidade monetária tem um valor "inflacionado" relativamente ao produto.
ResponderEliminarA posição da Alemanha vem sendo: "não temos nada com isso, equilibrem as vossas contas".
Se essa posição persiste, os países endividados jamais deixarão de estar subjugados ao diktat, pelo que a sua alternativa, para mim forçosa, é afirmar a sua disposição de abandonar o euro. Os prejuízos não seriam unilaterais e seguramente que colocariam os senhores do mercado internos perante a iminência de barreiras à liberdade de circulação de bens e de capitais de que a sua potente economia carece.
Mas isso é uma mudança de paradigma de que a Alemanha definitivamente não gosta. E temo que reaja à bruta.
Então, o Euro é a fonte de todas as nossas desgraças. Vamos assumir que sim. Usando o mesmo argumento da garrafa ou do copo meio cheio ou meio vazio, qual é a solução: Portugal sair do Euro ou a Alemanha sair do Euro?
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