sábado, 3 de setembro de 2011

Eu, português, envergonhado

Segundo o Público: “O Governo português é contra as eurobonds. Esta é a posição oficial, garantiu ontem ao PÚBLICO Rui Baptista, assessor do primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho: ‘A posição oficial do Governo é a que o primeiro-ministro disse ontem [quinta-feira].‘ (…) Passos Coelho declarou: ‘Acompanho em grande medida aquilo que disse a senhora Merkel. Não podemos olhar para um princípio de obrigações europeias como uma forma de resolvermos os problemas, que temos agora, de excesso de dívida.’ "
Isto é inacreditável. Já não bastava que o governo fosse mais troikista do que a troika, que esteja a carregar-nos com mais 6000 milhões de euros de impostos e cortes orçamentais (em sáude, educação e segurança social) do que está nos memorandos, que o inefável ministro Gaspar (essa figura psicologicamente estranha que fala com uma linguagem gestual bizarra e que anuncia aos “alunos”, em estilo “nerd”, as suas técnicas pedagógicas) afirme que a confiança dos mercados depende de sermos (nós quem?) mais papistas do que o papa.
Diga-se que nem o CDS vai tão longe, tendo Portas já manifestado simpatia por um instrumento como os “eurobonds”. Do outro lado, infelizmente para um PS agora em dificuldade de marcar diferença, Sócrates deu o exemplo de submissão à patroa prussiana, mas não a este ponto de Passos Coelho.
Recordemos o que são os “eurobonds”: mutualização da dívida, até certo limite que seja um compromisso entre a solidariedade europeia e o respeito pelos interesses razoáveis dos mais disciplinados em termos de dívida externa. Os “eurobonds” são emitidos centralmente, garantidos por toda a zona euro e, portanto, assegurados, em taxa de juro, pela confiança no conjunto, não no país isolado que emite dívida.
Não conseguiria indicar aqui um resumo legível de referências à defesa destes títulos, centenas que são, nos últimos tempos, de grandes economistas, incluindo prémios Nobel, ultimamente também dos países em situação de resgate e até da Espanha e da Itália. Também Juncker, o presidente do Eurogrupo, alguns dirigentes do BCE e até Durão Barroso têm mostrado alguma abertura subtil a esta solução, embora sem compromisso. Cá, ainda há minutos, ouvi Mário Soares defendê-los vigorosamente.
Em oposição irredutível mantém-se a senhora Merkel. Não porque tenha motivos técnicos e económicos contra os “eurobonds”, porque ela não dá mostras de ter alguma base sólida de pensamento económico, muito menos de pensamento estratégico em relação à defesa do euro e, afinal, do projeto europeu, que ela conduz para uma evolução suicidária acelerada. Pura e simplesmente, a senhora está apenas motivada pelo seu eleitoralismo, sabendo que passa hoje por toda a Europa rica do norte uma onda de egoísmo e sobranceria quase xenófoba em relação a outros parceiros europeus de que eles extraem, em boa parte, a sua riqueza. Eles estão a lutar na 3ª guerra, agora económica e, infelizmente, palpita-me que a vão ganhar.
Entre a solidariedade com os europeus periféricos, em dificuldades comuns, e a vergonhosa vassalagem ao governo alemão, Passos Coelho escolheu a segunda. Fê-lo, é verdade que se diga, com a autoridade que lhe deram os tais eleitores que, como aqui discuti, sendo maioria têm sempre razão.
Passos Coelho fez vergonhosamente o jogo do outro lado (apetecia-me dizer inimigo e acho que não estaria a exagerar). Se isto fosse mesmo guerra a sério, em termos militares convencionais, toda a gente sabe o que lhe aconteceria.

(Foto de Público)

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