domingo, 17 de julho de 2011

A “ajuda” é bom negócio

Estou atrasado na prometida conclusão da série de entradas “A maioria tem razão?”. É que, dia-a-dia, aquilo que eu queria discutir, as alternativas ao que a maioria aceita piedosamente, está a mudar, com a frente ideológica do neoliberalismo e da conceção germanocêntrica da Europa a alterar-se aceleradamente. Vejam só o que se segue, recolhido hoje no DN:
“Os resgates das dívidas de Portugal e da Irlanda têm sido um bom negócio para os países que lhes concederam garantias. Até hoje, só houve ganhos para os alemães, porque recebemos da Irlanda e de Portugal juros acima dos refinanciamentos que fizemos, e a diferença reverte a favor do orçamento alemão". (…) É o prémio pelas garantias que a Alemanha, dá, só que os contribuintes alemães não acreditam".
Quem foi o perigoso anti-europeu ou economista heterodoxo que disse isto? Chama-se Klaus Regling, é alemão e  presidente do Fundo Europeu de Estabilização Financeira (FEEF). Diria, sem ofensa aos bichos, que os ratos estão a sair deste navio que a comandanta prussiana - ou coisa de leste que a valha - teima em atirar contra as rochas, enquanto que os oficiais subalternos, a começar por Barroso, ouvem a orquestra de bordo tocar a “Ramona”.
E Regling até dissipou receios de que a situação se altere, se Dublin e Lisboa deixarem de poder pagar as suas dívidas, incluindo os juros (omite Atenas, porque obviamente, para ele, já não é caso de “se”). Se os países devedores deixarem de pagar os juros, os ricos vão pedir o dinheiro a quem deu garantias. Afirmou também que o FEEF não tem tido dificuldade em conseguir os fundos para os resgates. "Os investidores asiáticos compraram cerca de 40 por cento dos títulos, nas três emissões que fizemos". A juros que não conhecemos mas que, como diz Regling, são inferiores aos que pagamos pelo empréstimo do FEEF. 

E lembram-se de que os juros exigidos pelo FEEF e pelo BCE são consideravelmente mais altos do que os do execrado FMI? É que este não tem por objetivo, à alemã, ganhar sem baixas as guerras que perdeu antes. Sabem também que, quando foi perdoada à RFA a dívida das indemnizações de guerra, só houve um país que protestou e pretendeu ir para os tribunais internacionais? Ironia do destino, a Grécia!
A senhora que se cuide, porque este homem é bem capaz de a apear. É muito mais hábil politicamente, sabe convencer melhor os eleitores alemães, que na prática andam a ser afagados pela senhora no seu egoísmo xenófobo.
Com tudo isto, um dia destes, os 80% de eleitores portugueses que encarreiraram na solução única vão ficar confusos, porque a "realpolitik" - que, com os "diktats" dos banqueiros, acaba sempre por vencer o esquematismo ideológico - vai abalar essa certeza e, mesmo que mantendo ou acrescendo o seu caráter errático, vai-lhes mostrar que afinal há muitas outras soluções. Então, vão começar a perguntar se era mesmo preciso pagar meio subsídio de Natal, coisa que a hegemonia dos fazedores de opinião ainda não lhes permite entrar nas cabeças, mas logo veremos. 
Será que daqui a alguns meses ainda ouvirei, como hoje, gente da rua a responder “custa muito, não vai haver prendas, mas que se há-de fazer, é a única forma de ajudarmos o nosso país”?
(Foto do DN)

P. S. - Acaba de me escrever uma pessoa inteligente, interessada mas, para todos os efeitos, exemplo de "homem da rua". Votou regularmente num partido do sistema, zangou-se, votou agora no outro. E pergunta-me "quer que eu vote no PCP ou no BE?". Triste situação a que chegou a esquerda portuguesa, com tal clivagem deslocada, porque devia ser entre o PS aliado no seu campo natural (?) e o conjunto PSD-CDS. No entanto, há ainda uma hipótese. Votar branco. É um voto com grande significado político, embora sem efeitos institucionais. Há gente muito minha querida que vota assim.

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