sexta-feira, 2 de março de 2012

Bons alunos


A Europa é hoje uma escola primária à maneira de antigamente. Meninos bem comportados, uniformizados na sua bata branca (nada de vermelho!), retrato na parede do big brother da ideologia neo/ordo-liberal. De Cavaco a Passos Coelho, Guterres e Sócrates pelo meio, sempre o aluno português foi bem comportadinho, ganhando a medalhinha dos pastorinhos de Fátima.
No bom comportamento, há regras que não se discutem, até porque um pobrezinho para receber a esmola não pode tresandar a vinho. Regra das regras, o PEC de Maastricht, considerando crime contra a natureza, pedofilia contra a inocência infantil da virtude dos mercados, ultrapassar-se os míticos 3% de relação do défice orçamental em relação ao PIB.
Hoje, um primeiro ministro com quem até não tenho nenhuma afinidade, Mariano Rajoy, deu um murro na mesa e disse que o défice espanhol vai ficar em 5,8% e a Europa prussiana que se lixe. Como quem diz: atrevem-se a “chatear” a 3ª economia da eurolândia? Isto é deslocar a crise do terreno “cientificamente” económico para o verdadeiro terreno, o político. Aquele que está a ser totalmente diminuido em Portugal, com discursos de “que a economia manda, o que tem de ser tem muita força e temos de obedecer à receita da troika”.
Disse que não tenho afinidade com Rajoy mas tenho com os espanhóis, entre os quais conto dos meus melhores amigos, numa vida minha muito internacionalizada, profissionalmente. Sempre escrevi que, na nossa pequena dimensão, nos falta o sentido dos “grandes de España”, coisa vinda modernizada até amigos meus espanhóis de hoje, grandes homens de coluna ereta, grandes cientistas e convictos antifascistas. Nós somos “pequenos de Portugal”.
Marcante é que Rajoy tenha usado uma expressão magnífica para designar essa decisão: “Decisão soberana”. Tomem lá, Merkozys”! E mais Monti, que parece querer salvar Itália montando-a no burro franco-alemão.
E porque é que não se faz a urgentemente necessária frente do sul, na UE e na Eurolândia? Rajoy (que pena não ter sido Zapatero) promete, mas Itália e Grécia têm governos de banco-serviçais tecnocratas a soldo (bem pago) da ideologia dominante. Portugal tem um governo de escuteiros. Um grupo de meninos vestidos de pateta chefiados por um pateta vestido de menino.

4 comentários:

  1. O "murro" na mesa espanhol ainda não produziu efeitos. Ou melhor produziu já um: aumentou o risco da dívida. Se essa tendência não se inverter Rajov tem um futuro muito complicado quando for ao mercado -como obrigatoriamente tem de ir - colocar dívida espanhola.
    Eu, no teu caso, cederia menos à emoção e pensaria mais com a razão. Para já, e basta ler os jornais espanhóis, o desemprego está a aumentar e pode ir (Rl País) até aos 23,5%. Depois se verá se a espadeirada de Rajov não piora as coisas.
    Em segundo lugar, deixa os "grandes de Espanha sossegados. Basta lembrar a pobre senhora de Alba que tem um quarteirão de grandezas e arrasta pelos corredores das revistas de coração uma cara (?) desfeita pelas intervenções cirúrgicas. não melhorou mesmo se a pequena burguesia se comove com os seus noivados.
    Os restantes grandes não são muito melhores e só um regime tonto aguenta aquela gente que vive de esmolar à porta da Hola.
    Rajov não é flor que se cheire e não lhe vejo grande futuro político. Tem uma imensa maioria e brevemente vais ver o reverso da medalha: leis contra o aborto, contra o casamento dos homossexuais e recortes cada vez maiores de direitos laborais e de cidadania. E as fossas por abrir dos mortos anónimos da Republica.
    Eu, caro João, penso sempre que dos meus adversários ideológicos não devem vir achas para a minha fogueira. Daqui a três meses falamos mas fica já este lembrete.
    dizer que a Espanha rajoviana é um exemplo para nós é esquecer que se fizermos o mesmo amanhã nem tu nem eu recebemos as reformas. E os trabalhadores sejam eles quais forem também não verão a cor ao dinheiro dos salários. Estamos a viver dos balões de oxigénio que nos mandam trimestralmente. Tout court! O resto, é maravalhas, fogachos e ameaças ocas. O PC e o Bloco falam que falam apenas porque não governam. Acreditas que se governassem estaríamos melhor?

    E, finalmente, acaba-me com esse slogan da prussiana . A Merkel não é prussiana sequer de nascimento e foi educada no contraditório sistema comunista-evangélico. De todo o modo tem a confiança dos alemães que não nem piores nem melhores que os outros europeus.
    La guerre est fini, mon cher et il y a longtemps. Esta parte em franciu é para contrastar com a traquinice carmagnolesque do teu arrebatamento anti-bancário.
    Ando para aqui sozinho a gritar que primeiro deveríamos ver em que erramos. Depois, se for caso disso, lá iremos ajustar contas com os outros.

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  2. Caro Marcelo Ribeiro,
    Não o conheço mas permita-me que lhe diga que ganhou todo o meu respeito com este seu comentário do post do JVC.
    A lucidez e isenção que evidencia, assim com a ausência de complexos de esquerda ou direita, faltam muito, infelizmente, na blogosfera, fazendo com que a maioria das análises, feitas por pessoas de grande inteligência e conhecimento, resvale para uma "clubite" que, invariavelmente, lhes tolda a clarividência.
    Obrigado.
    JR

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  3. Marcelo, como escreves, "Ando para aqui sozinho a gritar que primeiro deveríamos ver em que erramos". Em princípio, concordo contigo, com um pequeno-grande senão. É que me parece que tu só queres ver as coisas e os erros na dimensão do retângulo, quando eu acho que o que errámos, e foi muito, desde Cavaco até agora, não é separável dos erros fundamentais do projeto do euro e, mais recentemente, do neo/ordoliberalismo merkoziano e de todos os seus acólitos.

    Vá lá, dou-te razão numa coisa, a senhora nem tem nível para ser exemplo da mentalidade histórica prussiana. Essa do evangelho-comunismo é bem achada.

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  4. Anónimo, o MCR, meu estimadíssimo amigo, desde o ano da luta académica de 62, tem entradas magníficas de inteligência, cultura e humor no blogue Incursões

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