Ato I. Cenário: fotografias de bancos cipriotas com alto risco de insolvência, muito baixo “core tier 1”, sem liquidez, lavadores de dinheiro. Atores: os dezassete do eurogrupo, a comissão europeia, o FMI e o próprio presidente de Chipre. Chegam unanimemente a acordo sobre um resgate de 10.000 milhões de euros, com contrapartida de um imposto sobre todos os depósitos bancários em Chipre, de nacionais ou estrangeiros, no valor total de 5800 milhões de euros e com taxa de 6,75% para depósitos até 100.000 euros e de 9,9% (parece valor de campanha de supermercado…) para depósitos de maior valor. Entra um coro de deputados cipriotas. Alguns permanecem calados e os outros proclamam que não aprovam o confisco.
Ato II. Ouvem-se muitas vozes de protesto nas ruas. Ao mesmo tempo, passam pela boca de cena muitos economistas americanos e europeus que apenas dizem “estúpidos, bem estamos a prevenir-vos”. Os atores mostram desnorteamento, aparentam “fugir com o rabo à seringa” e acusam-se mutuamente. Cada um puxa o patético presidente de Chipre. Dão o dito por não dito e concluem, novamente por unanimidade e total convicção, por nova proposta radicalmente diferente, tratando diferenciadamente os dois maiores bancos, envolvendo também acionistas e obrigacionistas (exceto o BCE e os bancos centrais dos países do euro) e isentando os depósitos de montante inferior a 100000 euros, à custa do agravamento substancial da taxa de “imposto” dos restantes (30 a 40%).
Ato III. Pretendendo fazer esquecer os dois primeiros atos e transformando a peça apenas neste ato final, entra a comissão europeia, a fazer doutrina geral. A taxação de depósitos bancários pode vir a ser regra no caso de “ajuda” a sistemas bancários em dificuldades e cujo estado membro venha a ser resgatado. Mas, com indignação virtuosa como se só ouvindo o coro de críticas, assegura (?) que nunca serão taxados os depósitos de montante inferior a 100.000 euros.
"Nunca, em nenhuma circunstância", apesar de ter estado à beira de acontecer? Não vale a pena ir assistir a esta farsa. E vamos exigir a devolução do bilhete antes que a tramoia nos tenha como assunto.