O PS é um partido essencial à vida política portuguesa; tenho nele bons amigos; tudo me permite falar da sua vida interna, ao contrário do que por vezes entendem os militantes socialistas. Muito mais quando até nem vou dizer nada de novo, que não tenha sido dito por membros do PS, embora muito minoritários. Por exemplo, que a eleição do secretário geral (SG) devia ter sido adiada. Julgo perceber que não o tenha sido, mas só no estertor final de uma lógica absurda de poder pessoal e de mentalidade cortesã (interessada) à volta de Sócrates (JS).
Poderão dizer-me que o adiamento da eleição do SG do PS seria uma violação dos estatutos. Talvez, desconheço as regras da casa. Mas esta crise, a perceção dos cenários óbvios, já vem de há tanto tempo que só a cegueira do PS, controlado pela cúria socrática e pelos interesses egocentristas do “príncipe” é que impediu a atitude minimamente sensata de se ter decidido um procedimento especial de prudência.
Dirá muita gente que o vencedor das próximas eleições (isto é, o mais votado, mas sem maioria absoluta) é indiscutivelmente o PSD, coisa de que não estou certo, como direi adiante. Se conseguir maioria absoluta com o CDS, pode formar o governo maioritário que Cavaco pretende, mas muita gente, cá dentro e lá fora, pressionará para a formação de um governo do “arco” (ou do pântano, “marais”, digo eu) com inclusão do PS. Haverá gente inteligente no PS com a sabedoria e distanciamento suficientes para perceber que uma travessia no deserto, com alguns brilharetes de “esquerda” na oposição, é benéfica, mas muitos mais, depois de tantos anos de empanturramento à mesa do orçamento, aceitarão a serventia em tal governo “nacional”. Não se esqueça também os que, certamente por convicção, defendem tal tese no PS, como, por exemplo, António José Seguro.
Parece-me impensável que o PS possa participar com papel secundário em tal governo apresentando JS como seu representante máximo; isto tanto pela inaceitabilidade de JS em tal quadro governamental como pelo próprio orgulho desmesurado de JS, que não se vê poder aceitar ser segundo. Pelo contrário, tudo seria mais fácil se JS não tivesse procurado agora esta legitimação acrescida, quase plebiscitária em termos do PS. O PS indicaria então um provisório como ministro destacado (de Estado, sem pasta ou numa das pastas “nobres”), ficando JS como SG, de simples continuidade em relação à situação atual, não com esta aclamação plebiscitária com resultado à norte-coreana. Só depois se faria a eleição de um novo SG, para integrar ou não o governo.
Claro que há uma alternativa, neste cenário de derrota eleitoral do PS, mas sem maioria absoluta do conjunto PSD/CDS e de necessidade de coligação grã-centrona com o PS: o da demissão de JS de SG do PS, em resultado das eleições. Seria uma confissão reforçada da derrota, uma humilhação pessoal que não se vê bem como JS aceitaria a não ser com pistola apontada à cabeça. Entretanto, o PS teria de indicar para o governo uma pessoa ainda à espera de futura validação eleitoral como SG do PS, o que enfraqueceria a sua posição no governo de coligação.
E se JS ganhar, com maioria relativa? Há quem ache tolice pensar-se em tal hipótese, mas não é verdade. A diferença de votos, nas sondagens, é grande, mas ainda há muita água para passar debaixo da ponte. É muito possível que, em Abril, incapaz de saldar a dívida por recurso ao mercado e sem a UE ter decidido agora a possibilidade de compra de dívida no mercado primário pelo FEEF, JS ganhe votos pela sua vitimização, “estão a ver que por me demitirem é que veio o FMI”? E como é que o PSD vai ganhar votos quando não tem verdadeiras propostas alternativas a um PEC 4 que chumbou, e que chumbou por razões mais formais que substanciais? Pode dizer-se que, apesar disto, JS perderá porque o povo está farto e quer mudar. Todavia, e há muitos exemplos conhecidos, no momento do voto, em altura de crise, a zanga e o desejo de penalização podem ficar para trás do receio da incerteza do desconhecido.
Neste caso, o PS teria de ter previsto, já hoje, que uma sua eventual vitória relativa não tem efeitos práticos mantendo JS. PR, “poderes fácticos”, mercados, governos europeus, todos já dizem claramente que exigem um governo de maioria e certamente que o próprio PS não quererá reviver os últimos dois anos. Obviamente, e sendo o PS o primeiro partido, neste cenário, o bloco central, com ou sem CDS, é impossível com uma liderança do PS por JS. Que fazer? Se, no cenário de derrota do PS, ainda seria possível, embora caricata, a substituição de JS, não se percebe como seria ela possível no caso de JS ter uma vitória eleitoral, mesmo que relativa.
Claro que, teoricamente, ainda há outra solução, mas creio que ninguém deixará de a considerar irrealista: JS foi eleito hoje SG mas o próximo congresso, daqui a dias, decide indigitar outra pessoa como candidato a primeiro ministro. Irrealista? Apesar de tudo, neste labirinto em que o PS está à nora, desorientado, talvez seja a única coisa acertada.
Muita gente andará hoje no PS a perguntar-se “o que vamos fazer com este cadáver adiado?”. Deviam ter pensado nisto quando ainda era tempo e ele não tivesse ainda de ser despejado com os pés para a frente, para, em termos políticos e como se diz na minha terra, “ir comer as couves pela raiz”.
P. S. (as iniciais são coincidência...) - Se não me engano, um dos candidatos marginais a SG, não me lembro se Fonseca Ferreira se o já passado António Brotas, afirmou que só se candidatava a SG, porque, ganhando, manteria JS como candidato a primeiro ministro. Como se compreende do que escrevi, acho isso o cúmulo do surrealismo político.
P. S. (as iniciais são coincidência...) - Se não me engano, um dos candidatos marginais a SG, não me lembro se Fonseca Ferreira se o já passado António Brotas, afirmou que só se candidatava a SG, porque, ganhando, manteria JS como candidato a primeiro ministro. Como se compreende do que escrevi, acho isso o cúmulo do surrealismo político.
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