Se isto fosse escrito científico, como tantos que escrevi, teria de incluir referências bibliográficas exatas. Não tenho agora tempo, mas creio que não irei contra a informação segura que os meus leitores acumularam nas últimas semanas, mesmo que não tenhamos na ponta da língua datas e horas.
Recorde-se. De surpresa, na véspera da reunião europeia de 10.3, Sócrates (JS), pela voz do ministro das Finanças, anuncia o PEC 4, que vai apresentar em Bruxelas no dia seguinte. A presidência da República diz não ter sido informada, os partidos da oposição idem. O PSD, que estava vinculado ao seu compromisso infantil com o PEC 3, sente-se traído. E tudo isto parece inegável, porque é o próprio JS que vem explicar o secretismo, por questões de calendário - posse do PR, moção de censura do BE.
Vendo que tudo isto resultava na crise política - e agora nem discuto se desejada ou não pelo PS/JS - ele tem de antecipar o que vai ser a sua campanha eleitoral, de vitimização, de quem não teve nada a ver com a crise, muito menos com a sua consequência - que seria inevitável mesmo sem a crise - a intervenção externa. Põe a cereja neste bolo desonesto, que afinal não eram nada medidas decididas, eram linhas orientadoras, sempre abertas à discussão parlamentar.
Entretanto, sábado, já o Expresso tinha divulgado cartas para Bruxelas que deixavam muitas dúvidas sobre tudo isto. Também se noticiava por toda a parte que, nos dias anteriores, uma missão a Portugal da CE e do BCE tinha fechado negociações com o governo, nos termos anunciados logo a seguir como PEC 4. E ainda, com boa razão, se pensava já antes que tudo tinha começado por imposições da Sra. Merkel, na ida vassálica de JS a berlim.
Hoje, com a brutalidade arrogante de quem verdadeiramente manda na UE, e a negar a possibilidade de JS tentar reapresentar modificações ao PEC 4, veio Juncker afirmar, inequivocamente, que houve mesmo um compromisso definitivo de JS. “Aprovámos o programa de ajustamento tal como nos foi proposto pelo governo português [e] que foi avalizado tanto pela Comissão Europeia como pelo Banco Central Europeu”. Claríssimo: “aprovámos”, foi uma proposta para aprovação pelo conselho, não linhas de orientação; tinha sido avalizada previamente, às escondidas. Vinte e cinco poucas palavras para arrumar definitivamente JS como aquilo que hoje todo Portugal lhe chama: aldrabão, desonesto, mentiroso. Nunca, desde Costa Cabral e um pouco João Franco, alguém tinha sido tão visceralmente detestado pela enorme maioria dos portugueses, independentemente da sua simpatia partidária. Porque já não só está em causa a política, já é o carácter e a moral.
Vai haver eleições e terei muita dificuldade em decidir do meu voto. Depois aqui escreverei, a despertar debate com os meus amigos. Julgo ter suficientemente discernimento político para nunca ir votar no mano jota da outra etiqueta. Mas o voto não é só racional, também é ético. Eu teria vergonha de dizer aos filhos que eduquei que tinha votado num mentiroso e aldrabão.
Nota final - Tão amigos que nós somos, “porreiro, pá”, afinal um porta-voz de Barroso vem dizer que as declarações de Juncker não são bem assim. Também os parceiros sociais (claro que sem a CGTP) se preparam para grande encenação, com Sócrates, assinando um acordo na linha do PEC 4. Nada disto me parece que seja encomendado por JS para ainda tentar evitar o chumbo do PEC 4, é tudo já campanha eleitoral, da pobre vítima.
P. S. (21:08) - Acabei de ouvir Fernando Rosas a dizer que o que se vai passar agora é o normal funcionamento das instituições. Posso estar a ser baço, mas não vislumbrei sombra de ironia. Ouço mais, "dar lugar ao voto é a democracia, aliás vem provar a razão do BE e da sua moção de censura". Neste momento, com o povo aos berros e a encher a rua, o BE, pela voz de um dos seus principais dirigentes, tem este discurso estritamente institucional? E eu ainda a pensar que era uma hipótese minha de voto...
P. S. (21:08) - Acabei de ouvir Fernando Rosas a dizer que o que se vai passar agora é o normal funcionamento das instituições. Posso estar a ser baço, mas não vislumbrei sombra de ironia. Ouço mais, "dar lugar ao voto é a democracia, aliás vem provar a razão do BE e da sua moção de censura". Neste momento, com o povo aos berros e a encher a rua, o BE, pela voz de um dos seus principais dirigentes, tem este discurso estritamente institucional? E eu ainda a pensar que era uma hipótese minha de voto...
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