A economia não é tão difícil como parece. Muitas vezes, até em coisas decisivas, é uma mistura de aritmética simples e de bom senso. Caso destes é o dos multiplicadores, agora em foco. Alguns amigos meus dizem-me não compreender o que é isto. É muito simples, mesmo para quem como eu é leigo em economia.
Por cada euro conseguido de ganho no défice orçamental, o PIB varia x. É isto o multiplicador. Claro que tem consequências muito diferentes se x, o multiplicador, for igual, menor ou maior do que 1.
Se for 1, elas por elas. A austeridade não agrava o PIB mas não serve para nada, não propicia crescimento, eterniza a situação económica, não gera crescimento. Entretanto, todos sofremos com essa austeridade, para nada.
Pode ser menor do que 1? Seria bom. Gaspar começou por introduzir na sua folha de Excel um multiplicador de 0,5, sei lá onde o foi buscar. Depois 0,8, valor muito usado pelas agências internacionais e pelos dogmáticos do neo-liberalismo, sabe-se lá com que bases científicas. Até agora e ao documento do FMI. O resultado seria positivo. Por cada euro de corte na balança orçamental, a economia cresceria 1,25 euros (1:0,8). Não se percebe é como. Está-se a ver, só o nosso "nerd" é que não vê. Baixa acentuada de rendimentos do trabalho, aumento de impostos, desemprego, perda de poder de compra, baixa da procura interna, como é que cresce o PIB?
Agora vem o FMI, pela pena do seu economista chefe, dizer que estes multiplicadores são desajustados, devem ser calculados entre 0,9 e 1,7. Depois, um estudo de Barry Eichengreen, de Berkeley, e Kevin O'Rourke, da Universidade de Oxford, centra mais o multiplicador, à volta de 1,6.
Passamos portanto para a terceira hipótese, multiplicador maior do que 1, aquilo que o bom senso comum está a ver. Quer dizer que, por exemplo, 1 euro de diminuição do défice orçamental faz o PIB diminuir 1,6 euros. Isto significa logo uma coisa simplesmente aritmética. Para muitos efeitos, as metas e os indicadores são de relação percentual entre défice e PIB. Imaginemos um défice de D e um PIB de P. Se diminuirmos o défice em 10% – coisa brutal para o contribuinte – e isto resultar, por efeito do multiplicador, numa descida do PIB de 16%, o défice em relação ao PIB que era de D passa a ser [0,9 x D / (P x 0,84)]. Sem mais nada, o défice passa de (D/P) para 1,07 x (D/P), aumenta 7%, só por simples matemática.
Mas não é só isto. Para diminuir o tal euro no défice orçamental, ou se vai pelo aumento da receita ou pela diminuição da despesa. Ambas resultam em diminuição do poder de compra e da procura interna. Desemprego e maior despesa social, menor coleta de IRS. Retração do consumo, menor coleta de IVA. Etc. Daí o tal multiplicador, mas também a necessidade de cada vez maior austeridade. Já não basta cortar um euro, perdendo 1,6 euros no PIB. Vai ser preciso 1,5 ou 2 euros, logo perda de riqueza nacional de 2,4 ou 3,2%, e por aí fora. É isto a espiral recessionista!
Isto é economia de leigo para leigos. Não nos deixemos enganar, lá porque não somos economistas.
Isto é economia de leigo para leigos. Não nos deixemos enganar, lá porque não somos economistas.
O elementar bom senso serve também para ajudar alguns a compreender o que as abstracções matemáticas mal absorvidas podem deformar completamente. A anedota da média estatística ilustra isto à saciedade.
ResponderEliminarA política económica e fiscal radica e tem como limite não apenas a bondade da sua formulação teórica mas a extensão e compreensão do mandato em que assenta. O entendimento disto releva de puro senso comum, e escapa aos iluminados que recebem a inspiração do Além. Mesmo quando não esteja mais distante do que Berlim.
Mas acredito que parte da culpa é da Microsoft, que foi além da Lotus na massificação do acesso às folhas de cálculo. Se o sujeito tivesse de usar papel e lápis, decerto incumbiria um contabilista de tão reles - mas terra a terra - tarefa.
E o erro palmar não passaria...