quarta-feira, 11 de abril de 2012

Referendo a sério ou a brincar?


O governo português subscreveu o novo tratado “europeu”, dito de estabilidade, coordenação e governação na União Económica e Monetária. A Assembleia da República vai certamente ratificá-lo, nestes dias, dado que o PS já anunciou o seu voto favorável.  
O tratado vai acrescentar crise política à crise económica, financeira e social. Vai consagrar um pseudo-governo económico europeu que desvaloriza a solidariedade, que fomenta os desequilíbrios e os egoismos nacionais dos países centrais, que limita consideravelmente as soberanias, que introduz penalizações a competirem a órgãos sem legitimidade democrática e que, reforçando a visão dogmática e quase de proselitismo da cruzada neoliberal, vai lançar mais petróleo no incêndio do edifício do euro.
Muito mais do que aquando da ratificação de tratados anteriores, achei que este caso merecia um referendo e que esse referendo poderia motivar os portugueses a refletirem um pouco sobre a crise que lhes estão a impôr, gente de dentro e de fora. Escrevi-o aqui e aqui. Amigos meus criticaram-me por, nestes tempos de perplexidade e de fácil demagogia baseada na “economia moral” ou na parábola do “velho devedor honesto”, um referendo poder ser um tiro no pé, legitimando, pela vitória quase inevitável do “sim”, o tratado que combatemos.
Não estou bem certo. A ratificação pela AR também o legitima, indiretamente, e com maior manipulação, porque o tratado vai ser aprovado pelos “representantes de 80% dos portugueses”. E perde-se uma grande oportunidade de discussão política e de esclarecimento de tanta gente confusa que por aí anda.
Coisa diferente é o que vai ser a atitude da nossa ala parlamentar mais à esquerda. O BE falou em referendo já há bastante tempo e calou-se. O PCP disse que ia ver e ficou mudo. Agora, anunciam que, no dia da ratificação parlamentar, vão apresentar propostas de convocação de um referendo. Nem me digno tentar demonstrar o absurdo desta posição descaradamente oportunista; seria desconsiderar a capacidade crítica dos meus leitores.
O que vale a pena perguntar é se podemos vislumbrar entre a santa trindade interna e este manobrismo da esquerda “radical” (entre aspas, porque radical é outra coisa) alguma alternativa. Virá ela, não se sabe como, de movimentos efémeros que se esfumam? Ou não é mesmo vital a criação de um novo partido

2 comentários:

  1. Concordo consigo sobre a necessidade inadiável de chamar cada um às suas responsabilidades, sem os joguinhos do costume dos sábios habituais, sempre a feijões.
    Não tenho o menor respeito pelos diletantes do "saber", impotentes na sua paquidérmica empáfia. Nunca mostraram tomates, mas falam como se os tivessem. Bom, talvez. Em lata, muita lata.
    Mas temo - já lho disse - que um "novo" partido seja "mais do mesmo", por serem tributários da mesma desacreditada e corrupta lógica representativa, e falharem uma vez mais o momento participátivo, que será decerto o fulcro de toda a evolução da democracia.
    As reacções dos diletantes däo-me que pensar.

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  2. O talvez não da minha resposta advêm do tremendo desequilíbrio que suponho existir no seu substrato possível, entre massa pensante e massa actuante.
    Diletantes bem pensantes, viciados na demarcação territorial do seu feudo imaginário, tendem a ver a dor do parto com binóculos.
    A bem dizer, muitos nem sequer precisam da realidade: esta é que precisa deles, para se tornar inteligível e ficar, vá lá, aceitável, mesmo se insuportável.
    Falo por mim, claro.
    Não me tenho os meus préstimos em grande conta, nesta matéria.
    Mas admiro a coragem cívica de quem os tenha e os arrisque no tabuleiro. Mereceria melhor sorte.

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